Imagine que uma autarquia estadual, cuja finalidade estatutária é a proteção e defesa do consumidor, tenha ajuizado ação civil pública contra a Caixa Beneficente dos Funcionários do Banco do Estado, questionando o reajuste dos valores dos planos de saúde de autogestão, por ela administrados, que asseguram assistência médica e hospitalar aos funcionários do Banco.
Em sua defesa, a Caixa Beneficente alegou a ilegitimidade ativa da autarquia, por ausência de pertinência temática.
Em sua réplica, a autarquia rebateu, afirmando que, por disposição expressa de lei, apenas associações devem comprovar o requisito da pertinência temática.
Sobre o tema, considerando os entendimentos doutrinários e jurisprudenciais, além da legislação de regência, discorra sobre quem está com razão.
Espelho Comentado
A pertinência temática consiste na:
“harmonização entre as finalidades institucionais das associações civis ou dos órgãos públicos legitimados e o objeto a ser tutelado na ação civil pública. Em outras palavras, mencionadas pessoas somente poderão propor a ação civil pública em defesa de um interesse cuja tutela seja de sua finalidade institucional”
(DE SOUZA, Motauri Ciocchetti. Ação Civil Pública e Inquérito Civil. 5ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2013, p. 78).
Assim, o autor de uma ACP deverá, em regra, demonstrar a sua pertinência temática para aquele interesse tutelado.
Se não houver pertinência temática, a parte deve ser considerada ilegítima para o ajuizamento da ACP, o que ocasionará a extinção do processo sem resolução de mérito (art. 485, VI, CPC).
Pela análise literal do art. 5º da Lei nº 7.347/85, apenas é exigido expressamente de associação a comprovação de pertinência temática para propositura de ação civil pública.
Assim, em uma interpretação literal, as autarquias, empresas públicas, fundações públicas e sociedades de economia mista não precisariam comprovar a pertinência temática para ajuizarem ações coletivas.
Ocorre que o STJ não adota essa interpretação literal. Isso porque não se pode esquecer que as autarquias, empresas públicas, fundações públicas e sociedades de economia mista possuem competências legais e estatutárias, as quais delimitam o seu campo de atuação.
Justamente por isso, a doutrina defende, e o STJ encampou, a tese de que as entidades da administração pública indireta somente poderão ingressar com ACP se demonstrarem a pertinência temática. STJ. 4ª Turma. REsp 1978138-SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 22/03/2022 (Info 731).
“Não basta a existência fática de uma pessoa da Administração Pública indireta: necessário se faz o exame de seu regime estatutário (lei, regulamento, contrato ou ato de constituição etc.). Será o seu estatuto que conferirá legitimidade adequada (ou não) à pessoa jurídica, com densidades diferentes: uma coisa é uma autarquia; outra, uma sociedade de economia mista com capital aberto na bolsa de valores”
(MOREIRA, Egon Bockmann; BAGATIN, Andreia Cristina; ARENHART, Sérgio Cruz; FERRARO, Marcella Pereira. Comentários à Lei de Ação Civil Pública. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019, pp. 371).
Em suma:
A legitimidade ativa na ação civil pública das pessoas jurídicas da administração pública indireta depende da pertinência temática entre suas finalidades institucionais e o interesse tutelado. STJ. 4ª Turma. REsp 1.978.138-SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 22/03/2022 (Info 731).
Sedimento este primeiro ponto, resta saber se, no caso concreto, a autarquia possui pertinência temática.
Consoante o enunciado, o objetivo institucional da autarquia é a proteção e a defesa do consumidor. Ocorre que o plano de saúde gerido pela Caixa Beneficente (cujo reajuste de valores se pretende impugnar) é um plano de saúde de autogestão, criado para assegurar assistência médica e hospitalar dos funcionários do Banco do Estado.
Sobre o tema, o STJ consagrou o entendimento no sentido de que não se aplica o Código de Defesa do Consumidor ao contrato de plano de saúde administrado por entidade de autogestão, haja vista a inexistência de relação de consumo:
Súmula 608-STJ: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.
Dessa forma, como o objetivo da autarquia é a defesa dos interesses dos consumidores e tendo em vista que os usuários do plano de saúde em comento não podem ser considerados como consumidores, fica muito clara a ausência de pertinência temática.
Detonando na Discursiva 11 de abril
Imagine que uma autarquia estadual, cuja finalidade estatutária é a proteção e defesa do consumidor, tenha ajuizado ação civil pública contra a Caixa Beneficente dos Funcionários do Banco do Estado, questionando o reajuste dos valores dos planos de saúde de autogestão, por ela administrados, que asseguram assistência médica e hospitalar aos funcionários do Banco.
Em sua defesa, a Caixa Beneficente alegou a ilegitimidade ativa da autarquia, por ausência de pertinência temática.
Em sua réplica, a autarquia rebateu, afirmando que, por disposição expressa de lei, apenas associações devem comprovar o requisito da pertinência temática.
Sobre o tema, considerando os entendimentos doutrinários e jurisprudenciais, além da legislação de regência, discorra sobre quem está com razão.
Espelho Comentado
A pertinência temática consiste na:
Assim, o autor de uma ACP deverá, em regra, demonstrar a sua pertinência temática para aquele interesse tutelado.
Se não houver pertinência temática, a parte deve ser considerada ilegítima para o ajuizamento da ACP, o que ocasionará a extinção do processo sem resolução de mérito (art. 485, VI, CPC).
Pela análise literal do art. 5º da Lei nº 7.347/85, apenas é exigido expressamente de associação a comprovação de pertinência temática para propositura de ação civil pública.
Assim, em uma interpretação literal, as autarquias, empresas públicas, fundações públicas e sociedades de economia mista não precisariam comprovar a pertinência temática para ajuizarem ações coletivas.
Ocorre que o STJ não adota essa interpretação literal. Isso porque não se pode esquecer que as autarquias, empresas públicas, fundações públicas e sociedades de economia mista possuem competências legais e estatutárias, as quais delimitam o seu campo de atuação.
Justamente por isso, a doutrina defende, e o STJ encampou, a tese de que as entidades da administração pública indireta somente poderão ingressar com ACP se demonstrarem a pertinência temática. STJ. 4ª Turma. REsp 1978138-SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 22/03/2022 (Info 731).
Em suma:
A legitimidade ativa na ação civil pública das pessoas jurídicas da administração pública indireta depende da pertinência temática entre suas finalidades institucionais e o interesse tutelado. STJ. 4ª Turma. REsp 1.978.138-SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 22/03/2022 (Info 731).
Sedimento este primeiro ponto, resta saber se, no caso concreto, a autarquia possui pertinência temática.
Consoante o enunciado, o objetivo institucional da autarquia é a proteção e a defesa do consumidor. Ocorre que o plano de saúde gerido pela Caixa Beneficente (cujo reajuste de valores se pretende impugnar) é um plano de saúde de autogestão, criado para assegurar assistência médica e hospitalar dos funcionários do Banco do Estado.
Sobre o tema, o STJ consagrou o entendimento no sentido de que não se aplica o Código de Defesa do Consumidor ao contrato de plano de saúde administrado por entidade de autogestão, haja vista a inexistência de relação de consumo:
Súmula 608-STJ: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.
Dessa forma, como o objetivo da autarquia é a defesa dos interesses dos consumidores e tendo em vista que os usuários do plano de saúde em comento não podem ser considerados como consumidores, fica muito clara a ausência de pertinência temática.
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