Neste artigo vamos falar sobre o direito das sucessões e seus princípios no Direito Civil. Convém mencionar, inicialmente, que a palavra “sucessão” possui duas acepções:
- no âmbito das relações negociais inter vivos, quando determinado bem é transferido de uma pessoa a outra, operando-se uma substituição entre elas;
- no âmbito hereditário ou mortis causa, quando, em virtude do falecimento de alguém, o seu patrimônio é transferido a determinadas pessoas, legitimadas a recebê-lo, as quais, assim, substituem-no na titularidade desses bens ou direitos.
Direito das Sucessões: conceito
O Direito das Sucessões trata sobre a segunda acepção, de modo que consiste no conjunto de normas que disciplina a transferência patrimonial de uma pessoa, em função de sua morte.
A sucessão hereditária pode ser dividida em:
- legítima (arts. 1.829 do CC) e
- testamentária (arts. 1.857 a 1.990 do CC).
Sucessão testamentária
A sucessão testamentária é aquela em que a transmissibilidade da herança é disciplinada por um ato jurídico negocial, especial e solene, chamado de testamento.
Sucessão legítima
A sucessão legítima, por sua vez, é aquela em que a transmissibilidade da herança é disciplinada pelas normas legais.
Em outras palavras, são as regras do Código Civil que cuidam de disciplinar a ordem de chamamento dos sucessores, também denominada ordem de “vocação legal”.
Para fins de fixação do conteúdo, veja-se o seguinte esquema:
SUCESSÃO LEGÍTIMA | SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA |
Decorre da lei, que enuncia a ordem de vocação hereditária, presumindo a vontade do autor da herança. É também denominada sucessão ab intestato justamente por inexistir testamento. | Tem origem em ato de última vontade do morto, por testamento, legado ou codicilo, mecanismos sucessórios para exercício da autonomia privada do autor da herança. |
A sucessão hereditária ainda comporta outra classificação:
- universal (arts. 1.829 a 1.856 do CC) e
- singular (arts. 1.912 a 1.940 do CC).
Isso significa que existem dois tipos de sucessores: o herdeiro, que sucede em caráter universal (a totalidade da herança ou uma fração dela) e o legatário (que sucede em bem ou direito individualizado).
Princípio da saisine
Traduz, ainda que por ficção jurídica, a transmissão imediata e automática do domínio e posse da herança aos herdeiros legítimos e testamentários, no instante da abertura da sucessão.
Tal princípio tem por objetivo impedir que o patrimônio deixado fique sem titular, enquanto se aguarda a transferência definitiva dos bens aos sucessores do falecido. Fundamenta-se no dispositivo que abre o Livro das Sucessões no Código Civil, a saber, o art. 1.784:
Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários.
Assim, a partir abertura da sucessão (morte), os herdeiros já são imediatamente considerados condôminos e compossuidores dos bens deixados, em virtude da incidência do presente princípio.
Isso não significa, contudo, que exercem direito exclusivo sobre bem individualmente considerado. Com efeito, os herdeiros têm um direito meramente abstrato, calculado em fração do patrimônio transferível, e, ainda que seja herdeiro único, o exercerá em face da universalidade de bens deixados, não se admitindo, sem a devida autorização judicial, enquanto não concluído o procedimento de arrolamento ou inventário, alienar bem exclusivo da herança.
No que se refere aos legatários, registra-se que eles somente terão a posse dos bens deixados quando assim lhe for concedido pelo herdeiro, nos termos do art. 1.923, § 1º, do CC.
Por fim, para evitar a aplicação deturpada (e gananciosa) do princípio da saisine, o STJ já entendeu que:
aquele que ocupa exclusivamente imóvel deixado pelo falecido deverá pagar aos demais herdeiros valores a título de aluguel proporcional, quando demonstrada oposição à sua ocupação exclusiva
(STJ. REsp 570.723-RJ. Rel. Min. Nancy Andrigui. Julgamento em 27/03/2007).
Princípio (non) ultra vires hereditatis
Inicialmente, esclarece-se que a expressão ultra vires hereditatis significa “além do conteúdo da herança”.
Tal expressão traduz a ideia de que o herdeiro, com a aceitação pura e simples da herança, poderia ser obrigado a pagar suas dívidas e obrigações, não só com os bens do patrimônio do de cujus, mas também com os seus próprios bens.
Frisa-se que tal situação, em regra, não é aceita, conforme consagrado no art. 1.792 do CC:
Art. 1.792. O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a escuse, demostrando o valor dos bens herdados.
Portanto, as dívidas do falecido devem ser pagas somente com seu próprio patrimônio, não ultrapassando as forças da herança.
Ademais, a transmissibilidade da obrigação alimentar merece alguns comentários. Como se sabe, o art. 1.700 do CC prescreve que a obrigação de prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor.
Segundo PABLO STOLZE e RODOLFO PAMPLONA:
a responsabilidade patrimonial do herdeiro pelas obrigações do falecido serão sempre non ultra vires hereditatis, inclusive quanto à obrigação alimentar.
Princípio da função social da herança
A herança também possui função social na medida em que permite uma redistribuição da riqueza do de cujus, transmitida aos seus herdeiros.
Além disso, certos institutos do Direito Sucessório, a exemplo do direito de representação, têm um fundamento moral, respaldado no princípio da isonomia e da função social, na medida em que visam a dar um tratamento equânime a herdeiros do autor da herança.
Princípio da territorialidade
De acordo com o art. 1.785 do CC:
Art. 1.785. A sucessão abre-se no lugar do último domicílio do falecido.
Disciplina-se, portanto, a delimitação da competência territorial referente às questões sucessórias.
Princípio da temporariedade
Nos termos do art. 1.787 do CC:
Art. 1.787. Regula a sucessão e a legitimação para suceder a lei vigente ao tempo da abertura daquela.
A norma está fundamentada na segurança das relações jurídicas consolidadas no momento da abertura da sucessão, até mesmo diante do já mencionado princípio da Saisine. Ademais, há respaldo constitucional na previsão contida no art. 5º, XXXVI, da CF, de que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.
No mesmo sentido foi editada a súmula 112 do STF, nos seguintes termos: “o imposto de transmissão causa mortis é devido pela alíquota vigente ao tempo da abertura da sucessão.”
Princípio do respeito à vontade manifestada
De acordo com esse princípio, admite-se a produção de efeitos post mortem das declarações de vontade do titular originário do patrimônio transferido.
Inclusive, a própria lógica da disciplina do Direito Sucessório é, em sede de testamento, a regulação de efeitos para quando o titular dos direitos não estiver mais presente.
Tal princípio prevalece, principalmente, diante de simples irregularidades testamentárias formais ou de modificações supervenientes de situação de fato, se for possível verificar, inequivocamente, qual era a intenção do testador.
Sucessões no Direito Civil: caiu no concurso
(CESPE / CEBRASPE – 2022 – DPE-PI – Defensor Público) O princípio de Saisine dispõe que, aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários. (C/E)
Comentários: A assertiva trouxe o exato conceito do princípio, que conta com previsão legal no art. 1.784 do CC/02: “Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários”.
Gabarito: CERTO.
Sucessões no Direito Civil: princípios que os definem
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Neste artigo vamos falar sobre o direito das sucessões e seus princípios no Direito Civil. Convém mencionar, inicialmente, que a palavra “sucessão” possui duas acepções:
Direito das Sucessões: conceito
O Direito das Sucessões trata sobre a segunda acepção, de modo que consiste no conjunto de normas que disciplina a transferência patrimonial de uma pessoa, em função de sua morte.
A sucessão hereditária pode ser dividida em:
Sucessão testamentária
A sucessão testamentária é aquela em que a transmissibilidade da herança é disciplinada por um ato jurídico negocial, especial e solene, chamado de testamento.
Sucessão legítima
A sucessão legítima, por sua vez, é aquela em que a transmissibilidade da herança é disciplinada pelas normas legais.
Em outras palavras, são as regras do Código Civil que cuidam de disciplinar a ordem de chamamento dos sucessores, também denominada ordem de “vocação legal”.
Para fins de fixação do conteúdo, veja-se o seguinte esquema:
SUCESSÃO LEGÍTIMA
SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA
Decorre da lei, que enuncia a ordem de vocação hereditária, presumindo a vontade do autor da herança. É também denominada sucessão ab intestato justamente por inexistir testamento.
Tem origem em ato de última vontade do morto, por testamento, legado ou codicilo, mecanismos sucessórios para exercício da autonomia privada do autor da herança.
A sucessão hereditária ainda comporta outra classificação:
Isso significa que existem dois tipos de sucessores: o herdeiro, que sucede em caráter universal (a totalidade da herança ou uma fração dela) e o legatário (que sucede em bem ou direito individualizado).
Princípio da saisine
Traduz, ainda que por ficção jurídica, a transmissão imediata e automática do domínio e posse da herança aos herdeiros legítimos e testamentários, no instante da abertura da sucessão.
Tal princípio tem por objetivo impedir que o patrimônio deixado fique sem titular, enquanto se aguarda a transferência definitiva dos bens aos sucessores do falecido. Fundamenta-se no dispositivo que abre o Livro das Sucessões no Código Civil, a saber, o art. 1.784:
Assim, a partir abertura da sucessão (morte), os herdeiros já são imediatamente considerados condôminos e compossuidores dos bens deixados, em virtude da incidência do presente princípio.
Isso não significa, contudo, que exercem direito exclusivo sobre bem individualmente considerado. Com efeito, os herdeiros têm um direito meramente abstrato, calculado em fração do patrimônio transferível, e, ainda que seja herdeiro único, o exercerá em face da universalidade de bens deixados, não se admitindo, sem a devida autorização judicial, enquanto não concluído o procedimento de arrolamento ou inventário, alienar bem exclusivo da herança.
No que se refere aos legatários, registra-se que eles somente terão a posse dos bens deixados quando assim lhe for concedido pelo herdeiro, nos termos do art. 1.923, § 1º, do CC.
Por fim, para evitar a aplicação deturpada (e gananciosa) do princípio da saisine, o STJ já entendeu que:
Princípio (non) ultra vires hereditatis
Inicialmente, esclarece-se que a expressão ultra vires hereditatis significa “além do conteúdo da herança”.
Tal expressão traduz a ideia de que o herdeiro, com a aceitação pura e simples da herança, poderia ser obrigado a pagar suas dívidas e obrigações, não só com os bens do patrimônio do de cujus, mas também com os seus próprios bens.
Frisa-se que tal situação, em regra, não é aceita, conforme consagrado no art. 1.792 do CC:
Portanto, as dívidas do falecido devem ser pagas somente com seu próprio patrimônio, não ultrapassando as forças da herança.
Ademais, a transmissibilidade da obrigação alimentar merece alguns comentários. Como se sabe, o art. 1.700 do CC prescreve que a obrigação de prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor.
Segundo PABLO STOLZE e RODOLFO PAMPLONA:
Princípio da função social da herança
A herança também possui função social na medida em que permite uma redistribuição da riqueza do de cujus, transmitida aos seus herdeiros.
Além disso, certos institutos do Direito Sucessório, a exemplo do direito de representação, têm um fundamento moral, respaldado no princípio da isonomia e da função social, na medida em que visam a dar um tratamento equânime a herdeiros do autor da herança.
Princípio da territorialidade
De acordo com o art. 1.785 do CC:
Disciplina-se, portanto, a delimitação da competência territorial referente às questões sucessórias.
Princípio da temporariedade
Nos termos do art. 1.787 do CC:
A norma está fundamentada na segurança das relações jurídicas consolidadas no momento da abertura da sucessão, até mesmo diante do já mencionado princípio da Saisine. Ademais, há respaldo constitucional na previsão contida no art. 5º, XXXVI, da CF, de que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.
No mesmo sentido foi editada a súmula 112 do STF, nos seguintes termos: “o imposto de transmissão causa mortis é devido pela alíquota vigente ao tempo da abertura da sucessão.”
Princípio do respeito à vontade manifestada
De acordo com esse princípio, admite-se a produção de efeitos post mortem das declarações de vontade do titular originário do patrimônio transferido.
Inclusive, a própria lógica da disciplina do Direito Sucessório é, em sede de testamento, a regulação de efeitos para quando o titular dos direitos não estiver mais presente.
Tal princípio prevalece, principalmente, diante de simples irregularidades testamentárias formais ou de modificações supervenientes de situação de fato, se for possível verificar, inequivocamente, qual era a intenção do testador.
Sucessões no Direito Civil: caiu no concurso
(CESPE / CEBRASPE – 2022 – DPE-PI – Defensor Público) O princípio de Saisine dispõe que, aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários. (C/E)
Comentários: A assertiva trouxe o exato conceito do princípio, que conta com previsão legal no art. 1.784 do CC/02: “Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários”.
Gabarito: CERTO.
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