O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu recentemente que não compete ao juízo estatal, em execução de título executivo extrajudicial que contenha cláusula compromissória ajuizada por credor sub-rogado, analisar questões alusivas às disposições do contrato em si, o que deve ser discutido na jurisdição arbitral.
De início, é relevante anotar que, salvo situações excepcionais de manifesta ilegalidade (cláusula patológica), é da jurisdição arbitral a atribuição para apreciar as controvérsias em torno da validade e dos efeitos da cláusula inserida pelas partes nos negócios jurídicos que formalizam.
Entretanto, no caso de execução, no julgamento do REsp 1.373.710/MG, a Terceira Turma do STJ afirmou que a existência de cláusula de arbitragem não pode impedir a execução de título extrajudicial perante a Justiça, justamente porque esta é a única competente para o exercício de medidas que visem à expropriação de bens do devedor.
Sendo assim, mostra-se correta a iniciativa de credora sub-rogada que ajuizou a execução do título perante o Poder Judiciário, pois outro modo não haveria de receber seu crédito na hipótese de insistência no cumprimento voluntário das obrigações contratuais.
Assim, a execução de título executivo que contenha cláusula compromissória por credor sub-rogado deve ser processada na jurisdição estatal, que, contudo, não tem competência para analisar as questões alusivas às disposições do contrato em si invocadas em embargos à execução.
Nessas situações, cabe ao executado que pretende questionar a própria exequibilidade do título dar início ao procedimento arbitral respectivo, nos termos do art. 8º, parágrafo único, da Lei n. 9.307/1996.
Não pode haver discussão, no processo executivo e em seus respectivos embargos, acerca da sub-rogação ou não da cláusula de arbitragem, pois as questões ligadas à sua validade e aos seus efeitos perante a exequente devem ser discutidas na jurisdição adequada, que seria a arbitral.
Por fim, caso julgue necessário, a embargante pode pleitear, perante o juízo, e desde que atendidos os requisitos legais (como, por exemplo, o oferecimento de garantia – art. 919, § 1º, do CPC/2015), a suspensão da execução até que as questões relativas à avença sejam definidas na jurisdição competente.
Caiu em concurso
Questão
(CEBRASPE, 2023; PGM São Paulo – Procurador do Município)
A concessionária de serviço público ALFA e o município de São Paulo celebraram contrato de concessão que previa a sujeição das partes à arbitragem em caso de desavenças. Por ter constatado o descumprimento de algumas das obrigações previstas no contrato, o município de São Paulo multou a empresa ALFA, que manifestou intenção de dar início ao procedimento arbitral. No entanto, o município recusou-se a assinar o compromisso arbitral.
Considerando a situação hipotética precedente, responda, justificadamente, de acordo com a legislação aplicável e a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), aos seguintes questionamentos.
1 Qual é a diferença entre cláusula compromissória e compromisso arbitral? Como esses conceitos se aplicam à situação hipotética apresentada? [valor: 1,00 ponto]
2 Qual seria a medida judicial adequada para impor o procedimento de arbitragem ao poder concedente? [valor: 0,50 ponto]
3 Na hipótese de a concessionária ter justificado o descumprimento de certa obrigação pelo fato de o município tê-la determinado de forma unilateral no curso do contrato, tal questão poderá ser objeto de arbitragem? [valor: 1,54 ponto]
Resposta Padrão (Gabarito Definitivo)
Tanto a cláusula compromissória quanto o compromisso arbitral fazem parte da chamada convenção de arbitragem. A cláusula compromissória é a convenção pela qual as partes do contrato comprometem-se a submeterem à arbitragem eventuais litígios futuros relativamente a tal contrato (art. 4.º da Lei n.º 9.307/1996).
A cláusula compromissória não se confunde com o compromisso arbitral. Entre outras diferenças, a cláusula compromissória consta do contrato, ao passo que o compromisso arbitral é firmado no início do procedimento de arbitragem.
Em linhas gerais, o compromisso arbitral contém as regras do procedimento de arbitragem. Nos termos da lei, trata-se da convenção por meio da qual as partes submetem um litígio à arbitragem (art. 9.º da Lei n.º 9.307/1996).
O compromisso arbitral contém, entre outras informações, o nome e a qualificação dos árbitros, a matéria que será objeto da arbitragem, o local onde a arbitragem será feita, o prazo para a apresentação da sentença, as leis e as normas aplicáveis, a autorização para julgamento por equidade, a fixação dos honorários dos árbitros, entre outras informações previstas nos arts. 10 e 11 da Lei n.º 9.307/1996.
Na situação hipotética, as partes assinaram a cláusula compromissória. Isso obriga a submissão das partes ao procedimento arbitral. Havendo a recusa de uma das partes em assinar o compromisso arbitral, esse pode ser lavrado em juízo.
A jurisprudência do STJ sedimentou o entendimento de que é possível a execução, no Poder Judiciário, de contrato que contenha cláusula de arbitragem, pois o juízo arbitral é desprovido de poderes coercitivos.
Assim, a jurisprudência do STJ converge com a previsão da Lei da Arbitragem, prevendo que o Poder Judiciário pode determinar que a lide seja submetida à arbitragem (com a ressalva dos contratos de adesão).
No caso em apreço, caberá à concessionária ingressar com uma ação de execução da cláusula compromissória. Se o município resistir, a sentença judicial poderá servir como compromisso arbitral (§ 7.º do art. 7.º da Lei n.º 9.307/1996).
Art. 7.º Existindo cláusula compromissória e havendo resistência quanto à instituição da arbitragem, poderá a parte interessada requerer a citação da outra parte para comparecer em juízo a fim de lavrar-se o compromisso, designando o juiz audiência especial para tal fim.
Por fim, o art. 1.º da Lei n.º 9.307/1996 prevê que somente podem ser objeto de arbitragem questões relativas a direitos patrimoniais disponíveis, de forma que pode ser eventualmente discutida a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro da nova obrigação, mas não a própria viabilidade jurídica de imposição unilateral da obrigação em si, eis que decorrente do exercício de prerrogativas legais do poder concedente.
Referências:
BRASIL. Lei Nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Brasília, DF: Diário Oficial da União, 2015.
STJ. Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Rel. para acórdão Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por maioria, julgado em 11/4/2023 – Informativo 770.
STJ. REsp n. 1.373.710/MG, relator ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 7/4/2015, DJe de 27/4/2015; STJ, REsp 2032426/DF, Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, DJe de 17/5/2023. STJ, AgInt no AREsp 2085301/SP, ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe de 31/3/2023.
O papel do juízo estatal na execução de título executivo extrajudicial que contenha cláusula compromissória
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu recentemente que não compete ao juízo estatal, em execução de título executivo extrajudicial que contenha cláusula compromissória ajuizada por credor sub-rogado, analisar questões alusivas às disposições do contrato em si, o que deve ser discutido na jurisdição arbitral.
De início, é relevante anotar que, salvo situações excepcionais de manifesta ilegalidade (cláusula patológica), é da jurisdição arbitral a atribuição para apreciar as controvérsias em torno da validade e dos efeitos da cláusula inserida pelas partes nos negócios jurídicos que formalizam.
Entretanto, no caso de execução, no julgamento do REsp 1.373.710/MG, a Terceira Turma do STJ afirmou que a existência de cláusula de arbitragem não pode impedir a execução de título extrajudicial perante a Justiça, justamente porque esta é a única competente para o exercício de medidas que visem à expropriação de bens do devedor.
Sendo assim, mostra-se correta a iniciativa de credora sub-rogada que ajuizou a execução do título perante o Poder Judiciário, pois outro modo não haveria de receber seu crédito na hipótese de insistência no cumprimento voluntário das obrigações contratuais.
Assim, a execução de título executivo que contenha cláusula compromissória por credor sub-rogado deve ser processada na jurisdição estatal, que, contudo, não tem competência para analisar as questões alusivas às disposições do contrato em si invocadas em embargos à execução.
Nessas situações, cabe ao executado que pretende questionar a própria exequibilidade do título dar início ao procedimento arbitral respectivo, nos termos do art. 8º, parágrafo único, da Lei n. 9.307/1996.
Não pode haver discussão, no processo executivo e em seus respectivos embargos, acerca da sub-rogação ou não da cláusula de arbitragem, pois as questões ligadas à sua validade e aos seus efeitos perante a exequente devem ser discutidas na jurisdição adequada, que seria a arbitral.
Por fim, caso julgue necessário, a embargante pode pleitear, perante o juízo, e desde que atendidos os requisitos legais (como, por exemplo, o oferecimento de garantia – art. 919, § 1º, do CPC/2015), a suspensão da execução até que as questões relativas à avença sejam definidas na jurisdição competente.
Caiu em concurso
Questão
(CEBRASPE, 2023; PGM São Paulo – Procurador do Município)
A concessionária de serviço público ALFA e o município de São Paulo celebraram contrato de concessão que previa a sujeição das partes à arbitragem em caso de desavenças. Por ter constatado o descumprimento de algumas das obrigações previstas no contrato, o município de São Paulo multou a empresa ALFA, que manifestou intenção de dar início ao procedimento arbitral. No entanto, o município recusou-se a assinar o compromisso arbitral.
Considerando a situação hipotética precedente, responda, justificadamente, de acordo com a legislação aplicável e a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), aos seguintes questionamentos.
1 Qual é a diferença entre cláusula compromissória e compromisso arbitral? Como esses conceitos se aplicam à situação hipotética apresentada? [valor: 1,00 ponto]
2 Qual seria a medida judicial adequada para impor o procedimento de arbitragem ao poder concedente? [valor: 0,50 ponto]
3 Na hipótese de a concessionária ter justificado o descumprimento de certa obrigação pelo fato de o município tê-la determinado de forma unilateral no curso do contrato, tal questão poderá ser objeto de arbitragem? [valor: 1,54 ponto]
Resposta Padrão (Gabarito Definitivo)
Tanto a cláusula compromissória quanto o compromisso arbitral fazem parte da chamada convenção de arbitragem. A cláusula compromissória é a convenção pela qual as partes do contrato comprometem-se a submeterem à arbitragem eventuais litígios futuros relativamente a tal contrato (art. 4.º da Lei n.º 9.307/1996).
A cláusula compromissória não se confunde com o compromisso arbitral. Entre outras diferenças, a cláusula compromissória consta do contrato, ao passo que o compromisso arbitral é firmado no início do procedimento de arbitragem.
Em linhas gerais, o compromisso arbitral contém as regras do procedimento de arbitragem. Nos termos da lei, trata-se da convenção por meio da qual as partes submetem um litígio à arbitragem (art. 9.º da Lei n.º 9.307/1996).
O compromisso arbitral contém, entre outras informações, o nome e a qualificação dos árbitros, a matéria que será objeto da arbitragem, o local onde a arbitragem será feita, o prazo para a apresentação da sentença, as leis e as normas aplicáveis, a autorização para julgamento por equidade, a fixação dos honorários dos árbitros, entre outras informações previstas nos arts. 10 e 11 da Lei n.º 9.307/1996.
Na situação hipotética, as partes assinaram a cláusula compromissória. Isso obriga a submissão das partes ao procedimento arbitral. Havendo a recusa de uma das partes em assinar o compromisso arbitral, esse pode ser lavrado em juízo.
A jurisprudência do STJ sedimentou o entendimento de que é possível a execução, no Poder Judiciário, de contrato que contenha cláusula de arbitragem, pois o juízo arbitral é desprovido de poderes coercitivos.
Assim, a jurisprudência do STJ converge com a previsão da Lei da Arbitragem, prevendo que o Poder Judiciário pode determinar que a lide seja submetida à arbitragem (com a ressalva dos contratos de adesão).
No caso em apreço, caberá à concessionária ingressar com uma ação de execução da cláusula compromissória. Se o município resistir, a sentença judicial poderá servir como compromisso arbitral (§ 7.º do art. 7.º da Lei n.º 9.307/1996).
Art. 7.º Existindo cláusula compromissória e havendo resistência quanto à instituição da arbitragem, poderá a parte interessada requerer a citação da outra parte para comparecer em juízo a fim de lavrar-se o compromisso, designando o juiz audiência especial para tal fim.
Por fim, o art. 1.º da Lei n.º 9.307/1996 prevê que somente podem ser objeto de arbitragem questões relativas a direitos patrimoniais disponíveis, de forma que pode ser eventualmente discutida a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro da nova obrigação, mas não a própria viabilidade jurídica de imposição unilateral da obrigação em si, eis que decorrente do exercício de prerrogativas legais do poder concedente.
Referências:
BRASIL. Lei Nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Brasília, DF: Diário Oficial da União, 2015.
STJ. Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Rel. para acórdão Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por maioria, julgado em 11/4/2023 – Informativo 770.
STJ. REsp n. 1.373.710/MG, relator ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 7/4/2015, DJe de 27/4/2015; STJ, REsp 2032426/DF, Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, DJe de 17/5/2023. STJ, AgInt no AREsp 2085301/SP, ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe de 31/3/2023.
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