Espelho Comentado
O enunciado buscou conhecimentos acerca de Direito Constitucional, notadamente no tocante ao controle de constitucionalidade. Inicialmente, era de se ressaltar que não cabe ação direta de inconstitucionalidade de lei municipal tomando como parâmetro normas exclusivas da Lei Orgânica Municipal, como foi o caso em tela.
Isso se deve ao fato de que, nos termos do art. 125, §2º, da CF/88, o ordenamento constitucional somente admite inconstitucionalidade de norma municipal levando como dispositivo ofendido a Constituição Estadual:
CF/88 Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição.
§ 1º A competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça.
§ 2º Cabe aos Estados a instituição de representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face da Constituição Estadual, vedada a atribuição da legitimação para agir a um único órgão.
O STF, inclusive, já declarou a inconstitucionalidade de Constituição Estadual que previa como parâmetro normas da Lei Orgânica Municipal.
Veja-se:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTS. 61, I, L; 63, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE PERNAMBUCO. OFENSA AOS ARTS. 52, X, E 125, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE CONTRA LEI ORGÂNICA MUNICIPAL. SUSPENSÃO DE LEI DECLARADA INCONSTITUCIONAL EM CONTROLE CONCENTRADO PELO PODER LEGISLATIVO. INCONSTITUCIONALIDADES.
AÇÃO JULGADA PROCEDENTE.
I – Não cabe controle concentrado de constitucionalidade de leis ou ato normativos municipais contra a Lei Orgânica respectiva. Precedente.
II – Não compete ao Poder Legislativo de qualquer das esferas federativas suspender a eficácia de ato normativo declarado inconstitucional em controle concentrado de constitucionalidade. Precedente.
III – Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente.
(STF – ADI: 5548 PE 4001615-09.2016.1.00.0000, Relator: RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 17/08/2021, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 24/08/2021)
Portanto, não seria possível, de plano, o cabimento da referida ação.
Sob outro aspecto, o STF possui entendimento no sentido de que, para se admitir o aditamento à petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade, a fim de que sejam incluídos novos dispositivos legais, deve se dispensar a requisição de novas informações e manifestações, bem como não prejudicar o cerne da ação.
No caso em tela, como já houve o andamento da ação, associado ao fato de que já ocorreu manifestação da Câmara Municipal, da PGE e do PGJ, devendo, por conta do aditamento, ocorrer mais uma manifestação dos órgãos envolvidos, não será possível o aditamento, uma vez ocorrida a preclusão.
É o entendimento do STF:
Este Supremo Tribunal assentou a inadmissibilidade do aditamento à inicial da ação após o recebimento das informações dos Requeridos e das manifestações do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República. Nesse sentido:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – QUESTÃO DE ORDEM – PETIÇÃO INICIAL – ADITAMENTO -REQUISIÇÃO DE INFORMAÇÕES JA ORDENADAIMPOSSIBILIDADE – PEDIDO INDEFERIDO. MEDIDA LIMINAR – INFORMAÇÕES CONSIDERADAS INDISPENSAVEIS A SUA APRECIAÇÃO – DISPENSA INDEFERIDA. COM A REQUISIÇÃO DE INFORMAÇÕES AO ÓRGÃO DE QUE EMANOU A LEI OU ATO NORMATIVO ARGUIDO DE INCONSTITUCIONAL OPERA-SE A PRECLUSAO DO DIREITO, RECONHECIDO AO AUTOR DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, DE ADITAR A PETIÇÃO INICIAL” (ADI 437-QO/DF, Rel. Min. Celso de Mello, Plenário, DJ 19.2.1993, grifos nossos).
No mesmo sentido são as seguintes decisões monocráticas: ADI 2.456/DF, de minha relatoria, DJe 29.3.2012; ADI 3.197/RJ, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 21.3.2012; ADI 3.309/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ 30.10.2007; e ADI 3.879/AM, Rel. Min. Menezes Direito, DJ 15.10.2007.
(STF – ADI: 4541 BA, Relator: CÁRMEN LÚCIA, Data de Julgamento: 19/04/2021, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 04/05/2021)
Dessa forma, deveria o candidato informar, também, a impossibilidade do aditamento realizado pelo prefeito no caso. Quanto ao ingresso do “amicus curiae”, o CPC/15 possui a seguinte previsão:
CPC/15 Art. 138. O juiz ou o relator, considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia, poderá, por decisão irrecorrível, de ofício ou a requerimento das partes ou de quem pretenda manifestar-se, solicitar ou admitir a participação de pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade especializada, com representatividade adequada, no prazo de 15 (quinze) dias de sua intimação.
§ 1º A intervenção de que trata o caput não implica alteração de competência nem autoriza a interposição de recursos, ressalvadas a oposição de embargos de declaração e a hipótese do § 3º.
§ 2º Caberá ao juiz ou ao relator, na decisão que solicitar ou admitir a intervenção, definir os poderes do amicus curiae.
§ 3º O amicus curiae pode recorrer da decisão que julgar o incidente de resolução de demandas repetitivas.
Todavia, apesar da previsão legal acima, o Supremo Tribunal Federal indica, como regra, a sua impraticabilidade no âmbito das ações de controle concentrado, como é o caso em tela.
A título de exemplo, seguem os seguintes precedentes:
O Supremo Tribunal Federal tem firme o entendimento de que as entidades que participam dos processos na condição de amicus curiae têm como papel instruir os autos com informações relevantes ou dados técnicos, não possuindo, entretanto, legitimidade para a interposição de recursos, inclusive embargos de declaração. Precedentes.
3. Ainda que a disciplina prevista no novo Código de Processo Civil a respeito do amicus curiae permita a oposição de embargos de declaração pelo interveniente (CPC/2015, art. 138, §1º), a regra não é aplicável em sede de ações de controle concentrado de constitucionalidade.
(STF. Plenário. ADI 4389 ED-AgR, Rel. Roberto Barroso, julgado em 14/08/2019).
EMENTA: CONTROLE ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE – DECISÃO QUE FUNDAMENTADAMENTE NÃO ADMITIU A INTERVENÇÃO, COMO “AMICUS CURIAE”, DE PESSOA FÍSICA – AUSÊNCIA DE REPRESENTATIVIDADE ADEQUADA – IMPOSSIBILIDADE DE DEFENDER, EM SEDE DE CONTROLE NORMATIVO ABSTRATO, DIREITOS E INTERESSES DE CARÁTER INDIVIDUAL E CONCRETO – LEGITIMIDADE DAQUELE QUE NÃO É ADMITIDO COMO “AMICUS CURIAE” PARA RECORRER DESSA DECISÃO DO RELATOR – AGRAVO INTERNO CONHECIDO – RECURSO IMPROVIDO.
(STF – ADI: 3396 DF 0000211-74.2005.1.00.0000, Relator: CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 06/08/2020, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 14/10/2020).
Todavia, apesar de prevalecer na jurisprudência do Supremo o entendimento acima, diante das peculiaridades do caso, o Ministro Luís Roberto Barroso admitiu a figura de uma pessoa física como “amicus curiae” em uma ação direta de inconstitucionalidade, levando em consideração a relevância da matéria e a especificidade do interesse:
Decisão:
1. O Senador José Renan Vasconcelos Calheiros requer ingresso no feito, a título de amicus curiae (Petição 56917/2021), na qualidade de relator da CPI da COVID-19.
2. Dada a relevância da matéria, a representatividade do postulante, na condição de relator da CPI da COVID-19, e a especificidade do interesse que representa, defiro seu ingresso no feito, tal como requerido (art. 7º, § 2º, da Lei 9.868/1999).
Publique-se. Brasília, 17 de junho de 2021. Ministro LUÍS ROBERTO BARROSO Relator
(STF – ADI: 6855 RN 0054874-11.2021.1.00.0000, Relator: ROBERTO BARROSO, Data de Julgamento: 17/06/2021, Data de Publicação: 22/06/2021)
Na situação narrada, deveria o candidato indicar as posições do STF, indicando que prevalece, atualmente, a impossibilidade de pessoa física ingressar como “amicus curiae” nas demandas envolvendo controle abstrato. Além disso, como o solicitante possui apenas dois mercados em todo o município, é de se questionar a representatividade adequada do sujeito.
Por fim, no mérito, o STF, julgando situação semelhante, declarou a constitucionalidade de lei municipal que estipula que os supermercados e hipermercados do Município ficam obrigados a colocar à disposição dos consumidores pessoal suficiente no setor de caixas, de forma que a espera na fila para o atendimento seja de, no máximo, 15 minutos. Isso se deve ao fato de que se trata de assunto de interesse local (art. 30, I, da CF/88), motivo pelo qual o município não usurpa competência da União para cuidar do tema.
CF/88 Art. 30. Compete aos Municípios:
I – legislar sobre assuntos de interesse local;
É constitucional lei municipal que estabelece que os supermercados e hipermercados do Município ficam obrigados a colocar à disposição dos consumidores pessoal suficiente no setor de caixas, de forma que a espera na fila para o atendimento seja de, no máximo, 15 minutos. Isso porque compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local, notadamente sobre a definição do tempo máximo de espera de clientes em filas de estabelecimentos empresariais.
(STF – AgR ARE: 809489 SP – SÃO PAULO, Relator: Min. ROSA WEBER, Data de Julgamento: 28/05/2019, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-173 09-08-2019).
Dessa forma, era de se concluir, além das inadmissões já explicitadas, pela constitucionalidade, no mérito, da lei municipal editada, tendo em vista se tratar de assunto de interesse local.
¹ – Art. 124 – São partes legítimas para promover ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo estadual ou municipal, em face desta Constituição:
IV – o Prefeito Municipal;
² – Art. 12. Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem-estar de sua população, cabendo-lhe, privativamente, as seguintes atribuições:
a) tarifas, preços e taxas dos serviços públicos;
b) tarifas dos serviços de táxi e mototáxi;
c) horário de funcionamento dos estabelecimentos industriais, comerciais e de serviços;
d) as datas de feriados municipais;
e) os limites das zonas de silêncio e de trânsito em condições especiais bem como sinalizadas.
³ – Art. 12. Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem-estar de sua população, cabendo-lhe, privativamente, as seguintes atribuições:
IX – fiscalizar, nos locais de venda, o peso, as medidas e as condições sanitárias dos gêneros alimentícios;
Detonando na Discursiva 21 de fevereiro
A Lei Municipal 123/14, editada na gestão anterior, determinou que ficam os Supermercados e Hipermercados do Município X obrigados a colocar à disposição dos consumidores, pessoal suficiente no setor de caixas, de forma que a espera na fila para o atendimento seja no prazo máximo de 15 (quinze) minutos, sob pena de multa.
O atual prefeito do município, na legitimidade que dispõe o art. 124, IV, da CE/PI¹, ingressou com uma ação direta de inconstitucionalidade da norma, perante o Tribunal de Justiça do Estado, solicitou a declaração de inconstitucionalidade da aludida norma municipal, sob o fundamento de que tal norma viola o art. 12, II², da Lei Orgânica Municipal, tendo em vista que compete a esta municipalidade tão somente a fiscalização daqueles serviços específicos listados no referido dispositivo.
Posteriormente, a Câmara Municipal, a Procuradoria do Estado e o Procurador-Geral de Justiça prestaram as informações devidas, conforme exigência prevista no despacho judicial. Ato contínuo, em aditamento à inicial, o prefeito indicou violação, também, ao art. 12, IX³, da Lei Orgânica Municipal, tendo em vista que compete ao município tão somente a fiscalização da venda, do peso, das medidas e das condições sanitárias dos gêneros alimentícios.
Posteriormente, Arnaldo, que possui dois mercadinhos na cidade, ingressou com pedido para se enquadrar como “amicus curiae”. Diante de todo o exposto, fundamente a viabilidade dos pedidos narrados acima.
Espelho Comentado
O enunciado buscou conhecimentos acerca de Direito Constitucional, notadamente no tocante ao controle de constitucionalidade. Inicialmente, era de se ressaltar que não cabe ação direta de inconstitucionalidade de lei municipal tomando como parâmetro normas exclusivas da Lei Orgânica Municipal, como foi o caso em tela.
Isso se deve ao fato de que, nos termos do art. 125, §2º, da CF/88, o ordenamento constitucional somente admite inconstitucionalidade de norma municipal levando como dispositivo ofendido a Constituição Estadual:
O STF, inclusive, já declarou a inconstitucionalidade de Constituição Estadual que previa como parâmetro normas da Lei Orgânica Municipal.
Veja-se:
Portanto, não seria possível, de plano, o cabimento da referida ação.
Sob outro aspecto, o STF possui entendimento no sentido de que, para se admitir o aditamento à petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade, a fim de que sejam incluídos novos dispositivos legais, deve se dispensar a requisição de novas informações e manifestações, bem como não prejudicar o cerne da ação.
No caso em tela, como já houve o andamento da ação, associado ao fato de que já ocorreu manifestação da Câmara Municipal, da PGE e do PGJ, devendo, por conta do aditamento, ocorrer mais uma manifestação dos órgãos envolvidos, não será possível o aditamento, uma vez ocorrida a preclusão.
É o entendimento do STF:
Este Supremo Tribunal assentou a inadmissibilidade do aditamento à inicial da ação após o recebimento das informações dos Requeridos e das manifestações do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República. Nesse sentido:
Dessa forma, deveria o candidato informar, também, a impossibilidade do aditamento realizado pelo prefeito no caso. Quanto ao ingresso do “amicus curiae”, o CPC/15 possui a seguinte previsão:
Todavia, apesar da previsão legal acima, o Supremo Tribunal Federal indica, como regra, a sua impraticabilidade no âmbito das ações de controle concentrado, como é o caso em tela.
A título de exemplo, seguem os seguintes precedentes:
Todavia, apesar de prevalecer na jurisprudência do Supremo o entendimento acima, diante das peculiaridades do caso, o Ministro Luís Roberto Barroso admitiu a figura de uma pessoa física como “amicus curiae” em uma ação direta de inconstitucionalidade, levando em consideração a relevância da matéria e a especificidade do interesse:
Decisão:
Na situação narrada, deveria o candidato indicar as posições do STF, indicando que prevalece, atualmente, a impossibilidade de pessoa física ingressar como “amicus curiae” nas demandas envolvendo controle abstrato. Além disso, como o solicitante possui apenas dois mercados em todo o município, é de se questionar a representatividade adequada do sujeito.
Por fim, no mérito, o STF, julgando situação semelhante, declarou a constitucionalidade de lei municipal que estipula que os supermercados e hipermercados do Município ficam obrigados a colocar à disposição dos consumidores pessoal suficiente no setor de caixas, de forma que a espera na fila para o atendimento seja de, no máximo, 15 minutos. Isso se deve ao fato de que se trata de assunto de interesse local (art. 30, I, da CF/88), motivo pelo qual o município não usurpa competência da União para cuidar do tema.
Dessa forma, era de se concluir, além das inadmissões já explicitadas, pela constitucionalidade, no mérito, da lei municipal editada, tendo em vista se tratar de assunto de interesse local.
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