Em maio de 2022, a Administração Pública Estadual realizou licitação para promover a contratação do serviço contínuo com dedicação exclusiva de mão-de-obra referente à limpeza de hospitais públicos estaduais.
No edital e no contrato existiam previsão no sentido de que, não ocorrendo o pagamento das verbas trabalhistas, poderia o Poder Público descontar tais valores do contrato para realizar a quitação aos empregados da contratada.
Posteriormente, após a assinatura do contrato administrativo, a contratada passou a dever verbas trabalhistas de seus empregados.
No primeiro mês, o Estado efetivou o desconto previsto no contrato.
Já no segundo mês, o Poder Público realizou a suspensão do pagamento mensal e ajuizou ação de consignação em pagamento, a fim de evitar qualquer responsabilização quanto aos débitos trabalhistas.
Diante de todo o exposto, indique em que consiste a responsabilidade da Administração Pública pelos débitos trabalhistas de suas contratadas.
Além disso, explique se o ato de efetuar o desconto no caso em tela é considerado válido e, por fim, indique qual é o juízo competente para a análise da ação de consignação em pagamento ajuizada.
Resposta
A questão exige conhecimento sobre licitações e contratos administrativos, bem como acerca da decisão do STF relacionada à responsabilidade da Administração Pública em face de débitos de suas terceirizadas.
Inicialmente, como o enunciado deixou claro que a contratação seria em maio de 2023, deveria ser afastada a hipótese de contratação pela Lei 8.666/93, que estará revogada em tal data, razão pela qual não se admitirá, no espelho, menção aos artigos da Lei 8.666/93.
Logo, a contratação só poderia tomar por base a nova lei de licitações e contratos, qual seja, a 14.133/21, publicada em 01/04/2021:
Lei 14.133/21 Art. 193. Revogam-se: II – a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, a Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002, e os arts. 1º a 47-A da Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011, após decorridos 2 (dois) anos da publicação oficial desta Lei.
Analisando a lei 14.133/21, o art. 121, §§ 1º e 2º, admite a responsabilização subsidiária do Poder Público pelos encargos trabalhistas se comprovada falha na fiscalização do cumprimento das obrigações do contratado nas contratações de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão-de-obra:
Lei 14.133/21 Art. 121. Somente o contratado será responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.
§ 1º A inadimplência do contratado em relação aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transferirá à Administração a responsabilidade pelo seu pagamento e não poderá onerar o objeto do contrato nem restringir a regularização e o uso das obras e das edificações, inclusive perante o registro de imóveis, ressalvada a hipótese prevista no § 2º deste artigo.
§ 2º Exclusivamente nas contratações de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra, a Administração responderá solidariamente pelos encargos previdenciários e subsidiariamente pelos encargos trabalhistas se comprovada falha na fiscalização do cumprimento das obrigações do contratado.
A Lei 14.133/21 foi além da Lei 8.666/93, que prevê o seguinte dispositivo a respeito do tema:
Lei 8.666/93 Art. 71. O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.
§ 1º A inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis.
O STF, por sua vez, declarou a constitucionalidade de tal dispositivo legal:
É constitucional a norma inscrita no art. 71, § 1º, da Lei federal nº 8.666, de 26 de junho de 1993, com a redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995
(STF. ADC 16, Rel. Min. Cezar Peluso, julgado em 24/11/2010).
Todavia, o TST, sumulando seu entendimento jurisprudencial, assim dispôs:
Súmula 331 TST: CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) – Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011
I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).
II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).
III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.
Sendo assim, o TST passou a entender que, em regra, a inadimplência ao contratado não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento.
Todavia, a Administração Pública terá responsabilidade subsidiária se ficar demonstrada a sua culpa “in vigilando”, ou seja, somente será responsabilidade se ficar comprovado que o Poder Público deixou de fiscalizar se a empresa estava cumprindo pontualmente suas obrigações trabalhistas, fiscais e comerciais.
É basicamente a atual redação do art. 121, §2º, da Lei 14.133/21.
Entretanto, a jurisprudência trabalhista construiu a tese de que a culpa da Administração seria presumida, de forma automática, não precisando o trabalhador comprovar a culpa do Poder Público nesses casos.
Entendendo que o TST extrapolou os limites da decisão contida na ADC 16, o STF, em sede de repercussão geral, proferiu a seguinte decisão:
É constitucional a norma inscrita no art. 71, § 1º, da Lei federal nº 8.666, de 26 de junho de 1993, com a redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995 (STF. ADC 16, Rel. Min. Cezar Peluso, julgado em 24/11/2010).
RECURSO EXTRAORDINÁRIO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA COM REPERCUSSÃO GERAL. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO DO TRABALHO. TERCEIRIZAÇÃO NO MBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. SÚMULA 331, IV E V, DO TST. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 71, § 1º, DA LEI Nº 8.666/93. TERCEIRIZAÇÃO COMO MECANISMO ESSENCIAL PARA A PRESERVAÇÃO DE POSTOS DE TRABALHO E ATENDIMENTO DAS DEMANDAS DOS CIDADÃOS. HISTÓRICO CIENTÍFICO. LITERATURA: ECONOMIA E ADMINISTRAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO HUMANO. RESPEITO ÀS ESCOLHAS LEGÍTIMAS DO LEGISLADOR. PRECEDENTE: ADC 16. EFEITOS VINCULANTES. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E PROVIDO. FIXAÇÃO DE TESE PARA APLICAÇÃO EM CASOS SEMELHANTES.
1. A dicotomia entre “atividade-fim” e “atividade-meio” é imprecisa, artificial e ignora a dinâmica da economia moderna, caracterizada pela especialização e divisão de tarefas com vistas à maior eficiência possível, de modo que frequentemente o produto ou serviço final comercializado por uma entidade comercial é fabricado ou prestado por agente distinto, sendo também comum a mutação constante do objeto social das empresas para atender a necessidades da sociedade, como revelam as mais valiosas empresas do mundo. É que a doutrina no campo econômico é uníssona no sentido de que as “Firmas mudaram o escopo de suas atividades, tipicamente reconcentrando em seus negócios principais e terceirizando muitas das atividades que previamente consideravam como centrais” (ROBERTS, John. The Modern Firm: Organizational Design for Performance and Growth. Oxford: Oxford University Press, 2007).
2. A cisão de atividades entre pessoas jurídicas distintas não revela qualquer intuito fraudulento, consubstanciando estratégia, garantida pelos artigos 1º, IV, e 170 da Constituição brasileira, de configuração das empresas, incorporada à Administração Pública por imperativo de eficiência (art. 37, caput, CRFB), para fazer frente às exigências dos consumidores e cidadãos em geral, justamente porque a perda de eficiência representa ameaça à sobrevivência da empresa e ao emprego dos trabalhadores.
3. Histórico científico: Ronald H. Coase, “The Nature of The Firm”, Economica (new series), Vol. 4, Issue 16, p. 386-405, 1937. O objetivo de uma organização empresarial é o de reproduzir a distribuição de fatores sob competição atomística dentro da firma, apenas fazendo sentido a produção de um bem ou serviço internamente em sua estrutura quando os custos disso não ultrapassarem os custos de obtenção perante terceiros no mercado, estes denominados “custos de transação”, método segundo o qual firma e sociedade desfrutam de maior produção e menor desperdício.
4. A Teoria da Administração qualifica a terceirização (outsourcing) como modelo organizacional de desintegração vertical, destinado ao alcance de ganhos de performance por meio da transferência para outros do fornecimento de bens e serviços anteriormente providos pela própria firma, a fim de que esta se concentre somente naquelas atividades em que pode gerar o maior valor, adotando a função de “arquiteto vertical” ou “organizador da cadeia de valor”.
5. A terceirização apresenta os seguintes benefícios:
(i) aprimoramento de tarefas pelo aprendizado especializado;
(ii) economias de escala e de escopo;
(iii) redução da complexidade organizacional;
(iv) redução de problemas de cálculo e atribuição, facilitando a provisão de incentivos mais fortes a empregados;
(v) precificação mais precisa de custos e maior transparência;
(vi) estímulo à competição de fornecedores externos;
(vii) maior facilidade de adaptação a necessidades de modificações estruturais;
(viii) eliminação de problemas de possíveis excessos de produção;
(ix) maior eficiência pelo fim de subsídios cruzados entre departamentos com desempenhos diferentes;
(x) redução dos custos iniciais de entrada no mercado, facilitando o surgimento de novos concorrentes;
(xi) superação de eventuais limitações de acesso a tecnologias ou matérias-primas;
(xii) menor alavancagem operacional, diminuindo a exposição da companhia a riscos e oscilações de balanço, pela redução de seus custos fixos;
(xiii) maior flexibilidade para adaptação ao mercado;
(xiii) não comprometimento de recursos que poderiam ser utilizados em setores estratégicos;
(xiv) diminuição da possibilidade de falhas de um setor se comunicarem a outros; e
(xv) melhor adaptação a diferentes requerimentos de administração, know-how e estrutura, para setores e atividades distintas.
6. A Administração Pública, pautada pelo dever de eficiência (art. 37, caput, da Constituição), deve empregar as soluções de mercado adequadas à prestação de serviços de excelência à população com os recursos disponíveis, mormente quando demonstrado, pela teoria e pela prática internacional, que a terceirização não importa precarização às condições dos trabalhadores.
7. O art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93, ao definir que a inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, representa legítima escolha do legislador, máxime porque a Lei nº 9.032/95 incluiu no dispositivo exceção à regra de não responsabilização com referência a encargos trabalhistas.
8. Constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93 já reconhecida por esta Corte em caráter erga omnes e vinculante: ADC 16, Relator (a): Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado em 24/11/2010.
9. Recurso Extraordinário parcialmente conhecido e, na parte admitida, julgado procedente para fixar a seguinte tese para casos semelhantes:
“O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93”.
(STF – RE: 760931 DF, Relator: ROSA WEBER, Data de Julgamento: 26/04/2017, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 12/09/2017).
Desse modo, a culpa da Administração Pública não pode ser presumida, pois não decorre automaticamente.
Todavia, exclusivamente no tocante ao ônus da prova, o STF indicou se tratar de matéria infraconstitucional, motivo pelo qual não poderia decidir a respeito.
Ocorre que o TST, segundo parcela da doutrina e da jurisprudência, continuou descumprindo a decisão da Suprema Corte.
Além disso, para evitar que suas decisões subam ao STF, decidiu o TST não existir transcendência nas demandas que envolvem a responsabilidade da Administração Pública dos encargos trabalhistas de seus contratados.
Posteriormente, buscando pacificar a solução, o STF decidiu haver Repercussão Geral sobre o tema referente (Tema 1.118).
Todavia, o tema ainda se encontra pendente de julgamento de mérito.
A título de informação, segue a decisão de admissibilidade da Repercussão Geral:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA POR ENCARGOS TRABALHISTAS GERADOS PELO INADIMPLEMENTO DE EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇOS CONTRATADA. AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE 16 E RECURSO EXTRAORDINÁRIO 760.931. TEMA 246 DA REPERCUSSÃO GERAL. RESPONSABILIZAÇÃO SUBSIDIÁRIA AUTOMÁTICA DA ADMINISTRAÇÃO. MERA PRESUNÇÃO DE CULPA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. MULTIPLICIDADE DE RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS. PAPEL UNIFORMIZADOR DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RELEV NCIA DA QUESTÃO CONSTITUCIONAL. MANIFESTAÇÃO PELA EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. (STF – RE: 1298647 SP, Relator: MINISTRO PRESIDENTE, Data de Julgamento: 10/12/2020, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 17/12/2020).
No caso em tela, deveria o candidato indicar corretamente os dispositivos da Lei 14.133/21, tratar do entendimento sumulado do TST, bem como informar a existência de decisões do STF indicando a constitucionalidade do dispositivo legal da Lei 8.666/93 e da ausência de responsabilidade automática do Poder Público para que ocorra a sua condenação subsidiária.
Já tratando sobre os demais pontos do enunciado, como forma de buscar eximir o Poder Público da responsabilidade subsidiária dos encargos trabalhistas, a Lei 14.133/21 indicou que pode a Administração Pública, nos contratos de serviços contínuos de dedicação exclusiva de mão-de-obra:
Lei 14.133/21 Art. 121. Somente o contratado será responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.
§ 3º Nas contratações de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra, para assegurar o cumprimento de obrigações trabalhistas pelo contratado, a Administração, mediante disposição em edital ou em contrato, poderá, entre outras medidas:
I – exigir caução, fiança bancária ou contratação de seguro-garantia com cobertura para verbas rescisórias inadimplidas;
II – condicionar o pagamento à comprovação de quitação das obrigações trabalhistas vencidas relativas ao contrato;
III – efetuar o depósito de valores em conta vinculada;
IV – em caso de inadimplemento, efetuar diretamente o pagamento das verbas trabalhistas, que serão deduzidas do pagamento devido ao contratado;
V – estabelecer que os valores destinados a férias, a décimo terceiro salário, a ausências legais e a verbas rescisórias dos empregados do contratado que participarem da execução dos serviços contratados serão pagos pelo contratante ao contratado somente na ocorrência do fato gerador.
Desse modo, como havia previsão no edital e no contrato, a dedução do pagamento devido ao contratado, em tese, é possível, com base no art. 121, §3º, IV, da Lei 14.133/21.
Por fim, em julgamento de Conflito de Competência, por entender que a lide tem natureza preponderantemente trabalhista (art. 114, IX, da CF/88), o STJ decidiu que compete à Justiça do Trabalho dispor acerca da ação de consignação em pagamento que a Administração Pública ajuíza para evitar a sua responsabilidade subsidiária pelos encargos trabalhistas:
Constituição Federal de 1988 Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: IX outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei.
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL. JUSTIÇA DO TRABALHO. CONTRATO DE TERCEIRIZAÇÃO. UNIÃO. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO DOS SALÁRIOS. RESPONSABILIDADE TRABALHISTA SUBSIDIÁRIA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO.
1. A Súmula 331 do eg. Tribunal Superior do Trabalho, cuidando da terceirização de serviços ligados à atividade-meio da Administração Pública, reza que “o inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial”.
2. A ação de consignação em pagamento proposta por ente estatal em face de sociedade empresária contratada para a prestação de serviços terceirizados à Administração Pública, visando elidir a responsabilidade trabalhista subsidiária, prevista na Súmula 331/TST, deve ser julgada pela Justiça Laboral.
3. Conflito conhecido para declarar competente a Justiça do Trabalho.
(STJ – CC: 136739 RS 2014/0275660-6, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 23/09/2015, S2 – SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 15/10/2015).
Portanto, deveria o candidato finalizar a sua resposta atestando a competência da Justiça do Trabalho para o julgamento da causa, nos termos do art. 114, IX, da CF/88, conforme entendeu o Superior Tribunal de Justiça.
Detonando na Discursiva 10 de janeiro
Em maio de 2022, a Administração Pública Estadual realizou licitação para promover a contratação do serviço contínuo com dedicação exclusiva de mão-de-obra referente à limpeza de hospitais públicos estaduais.
No edital e no contrato existiam previsão no sentido de que, não ocorrendo o pagamento das verbas trabalhistas, poderia o Poder Público descontar tais valores do contrato para realizar a quitação aos empregados da contratada.
Posteriormente, após a assinatura do contrato administrativo, a contratada passou a dever verbas trabalhistas de seus empregados.
No primeiro mês, o Estado efetivou o desconto previsto no contrato.
Já no segundo mês, o Poder Público realizou a suspensão do pagamento mensal e ajuizou ação de consignação em pagamento, a fim de evitar qualquer responsabilização quanto aos débitos trabalhistas.
Diante de todo o exposto, indique em que consiste a responsabilidade da Administração Pública pelos débitos trabalhistas de suas contratadas.
Além disso, explique se o ato de efetuar o desconto no caso em tela é considerado válido e, por fim, indique qual é o juízo competente para a análise da ação de consignação em pagamento ajuizada.
Resposta
A questão exige conhecimento sobre licitações e contratos administrativos, bem como acerca da decisão do STF relacionada à responsabilidade da Administração Pública em face de débitos de suas terceirizadas.
Inicialmente, como o enunciado deixou claro que a contratação seria em maio de 2023, deveria ser afastada a hipótese de contratação pela Lei 8.666/93, que estará revogada em tal data, razão pela qual não se admitirá, no espelho, menção aos artigos da Lei 8.666/93.
Logo, a contratação só poderia tomar por base a nova lei de licitações e contratos, qual seja, a 14.133/21, publicada em 01/04/2021:
Analisando a lei 14.133/21, o art. 121, §§ 1º e 2º, admite a responsabilização subsidiária do Poder Público pelos encargos trabalhistas se comprovada falha na fiscalização do cumprimento das obrigações do contratado nas contratações de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão-de-obra:
A Lei 14.133/21 foi além da Lei 8.666/93, que prevê o seguinte dispositivo a respeito do tema:
O STF, por sua vez, declarou a constitucionalidade de tal dispositivo legal:
Todavia, o TST, sumulando seu entendimento jurisprudencial, assim dispôs:
Sendo assim, o TST passou a entender que, em regra, a inadimplência ao contratado não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento.
Todavia, a Administração Pública terá responsabilidade subsidiária se ficar demonstrada a sua culpa “in vigilando”, ou seja, somente será responsabilidade se ficar comprovado que o Poder Público deixou de fiscalizar se a empresa estava cumprindo pontualmente suas obrigações trabalhistas, fiscais e comerciais.
É basicamente a atual redação do art. 121, §2º, da Lei 14.133/21.
Entretanto, a jurisprudência trabalhista construiu a tese de que a culpa da Administração seria presumida, de forma automática, não precisando o trabalhador comprovar a culpa do Poder Público nesses casos.
Entendendo que o TST extrapolou os limites da decisão contida na ADC 16, o STF, em sede de repercussão geral, proferiu a seguinte decisão:
É constitucional a norma inscrita no art. 71, § 1º, da Lei federal nº 8.666, de 26 de junho de 1993, com a redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995 (STF. ADC 16, Rel. Min. Cezar Peluso, julgado em 24/11/2010).
Desse modo, a culpa da Administração Pública não pode ser presumida, pois não decorre automaticamente.
Todavia, exclusivamente no tocante ao ônus da prova, o STF indicou se tratar de matéria infraconstitucional, motivo pelo qual não poderia decidir a respeito.
Ocorre que o TST, segundo parcela da doutrina e da jurisprudência, continuou descumprindo a decisão da Suprema Corte.
Além disso, para evitar que suas decisões subam ao STF, decidiu o TST não existir transcendência nas demandas que envolvem a responsabilidade da Administração Pública dos encargos trabalhistas de seus contratados.
Posteriormente, buscando pacificar a solução, o STF decidiu haver Repercussão Geral sobre o tema referente (Tema 1.118).
Todavia, o tema ainda se encontra pendente de julgamento de mérito.
A título de informação, segue a decisão de admissibilidade da Repercussão Geral:
Desse modo, como havia previsão no edital e no contrato, a dedução do pagamento devido ao contratado, em tese, é possível, com base no art. 121, §3º, IV, da Lei 14.133/21.
Por fim, em julgamento de Conflito de Competência, por entender que a lide tem natureza preponderantemente trabalhista (art. 114, IX, da CF/88), o STJ decidiu que compete à Justiça do Trabalho dispor acerca da ação de consignação em pagamento que a Administração Pública ajuíza para evitar a sua responsabilidade subsidiária pelos encargos trabalhistas:
Constituição Federal de 1988 Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: IX outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei.
Portanto, deveria o candidato finalizar a sua resposta atestando a competência da Justiça do Trabalho para o julgamento da causa, nos termos do art. 114, IX, da CF/88, conforme entendeu o Superior Tribunal de Justiça.
Materiais Gratuitos!
Acesse nossos cursos!
Grupo com materiais gratuitos!
Compartilhe!
Últimas notícias!
O Procurador Geral do Estado possui legitimidade para propor ação direta interventiva por inconstitucionalidade de Lei Municipal?
O Poder Executivo Estadual pode reter as contribuições previdenciárias dos membros e servidores do Ministério Público diretamente na fonte?
Lei Estadual pode permitir que membros do Ministério Público vinculados ao seu Estado permutem com membros do Ministério Público vinculados a outro Estado da federação?