Indique a ordem para que haja a incorporação de um tratado internacional na norma interna brasileira. Além disso, os referidos tratados possuem alguma ordem hierárquica?
Explique tomando como fundamento um tratado versando sobre direito humanos aprovado por maioria relativa e antes da EC 45/04, que incluiu os §§3º e 4º no art. 5º da Constituição Federal de 1988*.
Qual a natureza de um tratado que versa sobre Direito Tributário, levando em consideração a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça? Por fim, há alguma limitação circunstancial se um tratado internacional, versando sobre direitos humanos, aprovado pelo Decreto Legislativo 01/15, através de 2 turnos, com obtenção de 3/5 dos votos, promulgado pelo Decreto Executivo 01/18, enquanto o Brasil se encontra em intervenção federal? Fundamente.
*CF/88 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
Resposta
Em um primeiro momento, ressalta-se o cuidado para não confundir as fases de elaboração dos tratados (negociação, assinatura, ratificação, entrada em vigor e registro) com a incorporação do tratado na norma interna (celebração, englobando exposição de motivos e mensagem; decreto legislativo; ratificação e decreto executivo).
Os termos indicados, como variam por autor, não são relevantes para fins de pontuação neste espelho.
O que o candidato deveria informar era o trâmite previsto na Constituição Federal, explicando o previsto nos arts. 84, VIII, 49, I, 59, VI, da CF/88, sem, evidentemente, precisar mencioná-los.
Inicialmente, cumpre destacar que é papel do Chefe do Poder Executivo negociar, assinar e celebrar os tratados e atos internacionais (art. 84, VIII, da CF/88). Trata-se da denominada fase de celebração).
CF/88 Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
VIII – celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional;
Todavia, como o próprio dispositivo acima exige, o Presidente da República deve remeter a celebração do tratado para o Congresso Nacional resolver definitivamente sobre o tratado (art. 49, I, da CF/88):
CF/88 Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: I – resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional;
Uma vez aprovado, a autorização vem instrumentalizada através de um decreto legislativo, nos termos do art. 59, VI, da CF/88:
CF/88 Art. 59. O processo legislativo compreende a elaboração de: VI – decretos legislativos;
Assim, em que pese vozes contrárias na doutrina, prevalece o entendimento de que o Brasil adota o posicionamento da teoria dualista moderada, necessitando de aprovação do Congresso Nacional e promulgação do Presidente da República.
Destaca-se, no ponto, a posição adotada pelo STF, no julgamento da ADIn 1480-DF, conforme transcrito abaixo:
É na Constituição da República – e não na controvérsia doutrinária que antagoniza monistas e dualistas – que se deve buscar a solução normativa para a questão da incorporação dos atos internacionais ao sistema de direito positivo interno brasileiro.
O exame da vigente Constituição Federal permite constatar que a execução dos tratados internacionais e a sua incorporação à ordem jurídica interna decorrem, no sistema adotado pelo Brasil, de um ato subjetivamente complexo, resultante da conjugação de duas vontades homogêneas: a do Congresso Nacional, que resolve, definitivamente, mediante decreto legislativo, sobre tratados, acordos ou atos internacionais (CF, art. 49, I) e a do Presidente da República, que, além de poder celebrar esses atos de direito internacional (CF, art. 84, VIII), também dispõe – enquanto Chefe de Estado que é – da competência para promulgá-los mediante decreto.
iter procedimental de incorporação dos tratados internacionais – superadas as fases prévias da celebração da convenção internacional, de sua aprovação congressional e da ratificação pelo Chefe de Estado – conclui-se com a expedição, pelo Presidente da República, de decreto, de cuja edição derivam três efeitos básicos que lhe são inerentes:
(a) a promulgação do tratado internacional;
(b) a publicação oficial de seu texto; e
(c) a executoriedade do ato internacional, que passa, então, e somente então, a vincular e a obrigar no plano do direito positivo interno.
(STF – ADI: 1480 DF, Relator: Min. CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 26/06/2001, Data de Publicação: DJ 08/08/2001 PP-00003).
Sob outro aspecto, em regra, os tratados internacionais possuem a mesma equivalência de uma lei ordinária.
Todavia, caso a referida convenção cuide de direitos humanos, o tratado gozará de status de norma supralegal.
Ou seja, ele prevalecerá sobre as leis ordinárias, mas possui uma hierarquia inferior a uma emenda constitucional.
Além disso, caso, durante o trâmite legislativo, o tratado venha a ser aprovado com o quórum equivalente às emendas constitucionais (2 turnos, voto de 3/5), será ele dotado de status de emenda constitucional (art. 5º, §3º, da CF/88):
CF/88 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.
Por sua vez, o §3º do art. 5º da CF/88 foi inserido através da EC 45/04.
Diante disso, caso os tratados que versem sobre direitos humanos tenham sido aprovados antes da aludida emenda constitucional, eles possuirão status de norma supralegal.
É o caso, por exemplo, do Pacto de San José da Costa Rica/Convenção Americana de Direitos Humanos, que foi aprovado por maioria simples (Decreto 678/92).
PRISÃO CIVIL. Depósito. Depositário infiel. Alienação fiduciária. Decretação da medida coercitiva. Inadmissibilidade absoluta. Insubsistência da previsão constitucional e das normas subalternas. Interpretação do art. 5º, inc. LXVII e §§ 1º, 2º e 3º, da CF, à luz do art. 7º, § 7, da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica). Recurso improvido. Julgamento conjunto do RE nº 349.703 e dos HCs nº 87.585 e nº 92.566. É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito.
(STF – RE: 466343 SP, Relator: CEZAR PELUSO, Data de Julgamento: 03/12/2008, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 05/06/2009). Em outro contexto, a redação do art. 98, do CTN, assim dispõe:
CTN Art. 98. Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha.
A despeito da previsão acima, o STJ possuía precedentes no sentido de que os tratados que versam sobre Direito Tributário possuem natureza de lei ordinária, devendo verificar a especialidade caso a caso entre o direito internacional e a norma interna:
TRIBUTÁRIO. CONVENÇÕES INTERNACIONAIS CONTRA A BITRIBUTAÇÃO.BRASIL-ALEMANHA E BRASIL-CANADÁ. ARTS. VII E XXI. RENDIMENTOSAUFERIDOS POR EMPRESAS ESTRANGEIRAS PELA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ÀEMPRESA BRASILEIRA. PRETENSÃO DA FAZENDA NACIONAL DE TRIBUTAR, NAFONTE, A REMESSA DE RENDIMENTOS. CONCEITO DE “LUCRO DA EMPRESA ESTRANGEIRA” NO ART. VII DAS DUAS CONVENÇÕES. EQUIVALÊNCIA A “LUCROOPERACIONAL”. PREVALÊNCIA DAS CONVENÇÕES SOBRE O ART. 7º DA LEI9.779/99. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. ART. 98 DO CTN. CORRETA INTERPRETAÇÃO.
1. A autora, ora recorrida, contratou empresas estrangeiras para a prestação de serviços a serem realizados no exterior sem transferência de tecnologia. Em face do que dispõe o art. VII das Convenções Brasil-Alemanha e Brasil-Canadá, segundo o qual “os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só são tributáveis nesse Estado, a não ser que a empresa exerça sua atividade em outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento permanente aí situado”, deixou de recolher o imposto de renda na fonte.
2. Em razão do não recolhimento, foi autuada pela Receita Federal à consideração de que a renda enviada ao exterior como contraprestação por serviços prestados não se enquadra no conceito de “lucro da empresa estrangeira”, previsto no art. VII das duas Convenções, poiso lucro perfectibiliza-se, apenas, ao fim do exercício financeiro, após as adições e deduções determinadas pela legislação de regência. Assim, concluiu que a renda deveria ser tributada no Brasil – o que impunha à tomadora dos serviços a sua retenção na fonte -, já que se trataria de rendimento não expressamente mencionado nas duas Convenções, nos termos do art. XXI, verbis: “Os rendimentos de um residente de um Estado Contratante provenientes do outro Estado Contratante e não tratados nos artigos precedentes da presente Convenção são tributáveis nesse outro Estado”.
3. Segundo os arts. VII e XXI das Convenções contra a Bitributação celebrados entre Brasil-Alemanha e Brasil-Canadá, os rendimentos não expressamente mencionados na Convenção serão tributáveis no Estado de onde se originam. Já os expressamente mencionados, dentre eles o “lucro da empresa estrangeira”, serão tributáveis no Estado de destino, onde domiciliado aquele que recebe a renda.
4. O termo “lucro da empresa estrangeira”, contido no art. VII das duas Convenções, não se limita ao “lucro real”, do contrário, não haveria materialidade possível sobre a qual incidir o dispositivo, porque todo e qualquer pagamento ou remuneração remetido ao estrangeiro está – e estará sempre – sujeito a adições e subtrações ao longo do exercício financeiro.
5. A tributação do rendimento somente no Estado de destino permite que lá sejam realizados os ajustes necessários à apuração do lucro efetivamente tributável. Caso se admita a retenção antecipada – e portanto, definitiva – do tributo na fonte pagadora, como pretende a Fazenda Nacional, serão inviáveis os referidos ajustes, afastando-se a possibilidade de compensação se apurado lucro real negativo no final do exercício financeiro.
6. Portanto, “lucro da empresa estrangeira” deve ser interpretado não como “lucro real”, mas como “lucro operacional”, previsto nos arts. 6º, 11 e 12 do Decreto-lei n.º 1.598/77 como “o resultado das atividades, principais ou acessórias, que constituam objeto da pessoa jurídica”, ai incluído, obviamente, o rendimento pago como contrapartida de serviços prestados.
7. A antinomia supostamente existente entre a norma da convenção e o direito tributário interno resolve-se pela regra da especialidade, ainda que a normatização interna seja posterior à internacional.
8. O art. 98 do CTN deve ser interpretado à luz do princípio lex specialis derrogat generalis, não havendo, propriamente, revogação ou derrogação da norma interna pelo regramento internacional, mas apenas suspensão de eficácia que atinge, tão só, as situações envolvendo os sujeitos e os elementos de estraneidade descritos na norma da convenção.
9. A norma interna perde a sua aplicabilidade naquele caso especifico, mas não perde a sua existência ou validade em relação ao sistema normativo interno. Ocorre uma “revogação funcional”, na expressão cunhada por HELENO TORRES, o que torna as normas internas relativamente inaplicáveis àquelas situações previstas no tratado internacional, envolvendo determinadas pessoas, situações e relações jurídicas específicas, mas não acarreta a revogação, stricto sensu, da norma para as demais situações jurídicas a envolver elementos não relacionadas aos Estados contratantes.
10. No caso, o art. VII das Convenções Brasil-Alemanha e Brasil-Canadá deve prevalecer sobre a regra inserta no art. 7º da Lei 9.779/99, já que a norma internacional é especial e se aplica, exclusivamente, para evitar a bitributação entre o Brasil e os dois outros países signatários. Às demais relações jurídicas não abarcadas pelas Convenções, aplica-se, integralmente e sem ressalvas, a norma interna, que determina a tributação pela fonte pagadora a ser realizada no Brasil. 11. Recurso especial não provido.
(STJ – REsp: 1161467 RS 2009/0198051-2, Relator: Ministro CASTRO MEIRA, Data de Julgamento: 17/05/2012, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/06/2012).
Ocorre que atualmente o STJ vem entendendo que os tratados que versam sobre Direito Tributário já possuem uma maior especialidade, motivo pelo qual eles devem prevalecer sobre o direito interno.
Nesse sentido:
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. PREVALÊNCIA DOS TRATADOS INTERNACIONAIS TRIBUTÁRIOS SOBRE A NORMA DE DIREITO INTERNO. CONCEITO DE LUCRO. INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE RENDA. EMPRESA COM SEDE NA ESPANHA E SEM ESTABELECIMENTO PERMANENTE INSTALADO NO BRASIL. TRATADO TRIBUTÁRIO CELEBRADO ENTRE A REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL E O REINO DA ESPANHA. Decreto 76.975/76. COBRANÇA DE TRIBUTO QUE DEVE SER EFETUADA NO PAÍS DE ORIGEM (ESPANHA). RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A jurisprudência desta Corte Superior orienta que as disposições dos Tratados Internacionais Tributários prevalecem sobre as normas jurídicas de Direito Interno, em razão da sua especificidade, ressalvada a supremacia da Carta Magna. Inteligência do art. 98 do CTN. Precedentes: RESP 1.161.467/RS, Rel. Min. CASTRO MEIRA, DJe 1.6.2012; RESP 1.325.709/RJ, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe 20.5.2014.
2. O Tratado Brasil-Espanha, objeto do Decreto 76.975/76, dispõe que os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só são tributáveis neste mesmo Estado, a não ser que a empresa exerça sua atividade no outro Estado por meio de um estabelecimento permanente aí situado.
3. O termo lucro da empresa estrangeira deve ser interpretado não como lucro real, mas como lucro operacional, como o resultado das atividades, principais ou acessórias, que constituam objeto da pessoa jurídica, incluído, o rendimento pago como contrapartida de serviços prestados.
4. Parecer do MPF pelo conhecimento e provimento do recurso.
5. Recurso Especial da IBERDROLA ENERGIA S/A provido para assegurar o direito da recorrente de não sofrer a retenção de imposto de renda sobre a remuneração por ela percebida, nos termos que dispõe o Tratado Tributário firmado entre a República Federativa do Brasil e o Reino da Espanha.
(STJ – REsp: 1272897 PE 2011/0196684-9, Relator: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 19/11/2015, T1 – PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/12/2015).
Por fim, há algumas situações nas quais não será possível a modificação da Constituição Federal de 1988. Entre elas, encontra-se a limitação circunstancial, no sentido de que, enquanto existir intervenção federal, estado de sítio ou estado de defesa, a Constituição não pode ser emendada (art. 60, §1º, da CF/88).
CF/88 Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: § 1º A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio.
Todavia, no exemplo citado, como a aprovação do tratado ocorre pelo Poder Legislativo, a vedação constante no art. 60, § 1º da CF/88 deve ser analisada no momento da votação do tratado no Congresso Nacional.
Assim, tendo em vista que já tinha ocorrido o Decreto Legislativo antes do ingresso no Brasil a uma intervenção federal, o aludido tratado, ainda que o Decreto do Poder Executivo tenha ocorrido durante o aludido estado de crise, deve vigorar normalmente, não havendo que se falar em inconstitucionalidade no caso em tela.
Tal exemplo foi justamente o que aconteceu com o Tratado de Marrakesh. Na situação, através do Decreto Legislativo 261/15, o tratado foi aprovado com status de emenda constitucional.
Somente em 2018, através do Decreto Executivo 9.522/18, foi incorporado ao direito interno. O Brasil estava em intervenção federal no Rio de Janeiro, mas isso não foi óbice para a sua incorporação.
Detonando na Discursiva 01 de fevereiro
Indique a ordem para que haja a incorporação de um tratado internacional na norma interna brasileira. Além disso, os referidos tratados possuem alguma ordem hierárquica?
Explique tomando como fundamento um tratado versando sobre direito humanos aprovado por maioria relativa e antes da EC 45/04, que incluiu os §§3º e 4º no art. 5º da Constituição Federal de 1988*.
Qual a natureza de um tratado que versa sobre Direito Tributário, levando em consideração a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça? Por fim, há alguma limitação circunstancial se um tratado internacional, versando sobre direitos humanos, aprovado pelo Decreto Legislativo 01/15, através de 2 turnos, com obtenção de 3/5 dos votos, promulgado pelo Decreto Executivo 01/18, enquanto o Brasil se encontra em intervenção federal? Fundamente.
Resposta
Em um primeiro momento, ressalta-se o cuidado para não confundir as fases de elaboração dos tratados (negociação, assinatura, ratificação, entrada em vigor e registro) com a incorporação do tratado na norma interna (celebração, englobando exposição de motivos e mensagem; decreto legislativo; ratificação e decreto executivo).
Os termos indicados, como variam por autor, não são relevantes para fins de pontuação neste espelho.
O que o candidato deveria informar era o trâmite previsto na Constituição Federal, explicando o previsto nos arts. 84, VIII, 49, I, 59, VI, da CF/88, sem, evidentemente, precisar mencioná-los.
Inicialmente, cumpre destacar que é papel do Chefe do Poder Executivo negociar, assinar e celebrar os tratados e atos internacionais (art. 84, VIII, da CF/88). Trata-se da denominada fase de celebração).
Todavia, como o próprio dispositivo acima exige, o Presidente da República deve remeter a celebração do tratado para o Congresso Nacional resolver definitivamente sobre o tratado (art. 49, I, da CF/88):
Uma vez aprovado, a autorização vem instrumentalizada através de um decreto legislativo, nos termos do art. 59, VI, da CF/88:
Assim, em que pese vozes contrárias na doutrina, prevalece o entendimento de que o Brasil adota o posicionamento da teoria dualista moderada, necessitando de aprovação do Congresso Nacional e promulgação do Presidente da República.
Destaca-se, no ponto, a posição adotada pelo STF, no julgamento da ADIn 1480-DF, conforme transcrito abaixo:
É na Constituição da República – e não na controvérsia doutrinária que antagoniza monistas e dualistas – que se deve buscar a solução normativa para a questão da incorporação dos atos internacionais ao sistema de direito positivo interno brasileiro.
O exame da vigente Constituição Federal permite constatar que a execução dos tratados internacionais e a sua incorporação à ordem jurídica interna decorrem, no sistema adotado pelo Brasil, de um ato subjetivamente complexo, resultante da conjugação de duas vontades homogêneas: a do Congresso Nacional, que resolve, definitivamente, mediante decreto legislativo, sobre tratados, acordos ou atos internacionais (CF, art. 49, I) e a do Presidente da República, que, além de poder celebrar esses atos de direito internacional (CF, art. 84, VIII), também dispõe – enquanto Chefe de Estado que é – da competência para promulgá-los mediante decreto.
iter procedimental de incorporação dos tratados internacionais – superadas as fases prévias da celebração da convenção internacional, de sua aprovação congressional e da ratificação pelo Chefe de Estado – conclui-se com a expedição, pelo Presidente da República, de decreto, de cuja edição derivam três efeitos básicos que lhe são inerentes:
(a) a promulgação do tratado internacional;
(b) a publicação oficial de seu texto; e
(c) a executoriedade do ato internacional, que passa, então, e somente então, a vincular e a obrigar no plano do direito positivo interno.
(STF – ADI: 1480 DF, Relator: Min. CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 26/06/2001, Data de Publicação: DJ 08/08/2001 PP-00003).
Sob outro aspecto, em regra, os tratados internacionais possuem a mesma equivalência de uma lei ordinária.
Todavia, caso a referida convenção cuide de direitos humanos, o tratado gozará de status de norma supralegal.
Ou seja, ele prevalecerá sobre as leis ordinárias, mas possui uma hierarquia inferior a uma emenda constitucional.
Além disso, caso, durante o trâmite legislativo, o tratado venha a ser aprovado com o quórum equivalente às emendas constitucionais (2 turnos, voto de 3/5), será ele dotado de status de emenda constitucional (art. 5º, §3º, da CF/88):
Por sua vez, o §3º do art. 5º da CF/88 foi inserido através da EC 45/04.
Diante disso, caso os tratados que versem sobre direitos humanos tenham sido aprovados antes da aludida emenda constitucional, eles possuirão status de norma supralegal.
É o caso, por exemplo, do Pacto de San José da Costa Rica/Convenção Americana de Direitos Humanos, que foi aprovado por maioria simples (Decreto 678/92).
A despeito da previsão acima, o STJ possuía precedentes no sentido de que os tratados que versam sobre Direito Tributário possuem natureza de lei ordinária, devendo verificar a especialidade caso a caso entre o direito internacional e a norma interna:
Ocorre que atualmente o STJ vem entendendo que os tratados que versam sobre Direito Tributário já possuem uma maior especialidade, motivo pelo qual eles devem prevalecer sobre o direito interno.
Nesse sentido:
Por fim, há algumas situações nas quais não será possível a modificação da Constituição Federal de 1988. Entre elas, encontra-se a limitação circunstancial, no sentido de que, enquanto existir intervenção federal, estado de sítio ou estado de defesa, a Constituição não pode ser emendada (art. 60, §1º, da CF/88).
Todavia, no exemplo citado, como a aprovação do tratado ocorre pelo Poder Legislativo, a vedação constante no art. 60, § 1º da CF/88 deve ser analisada no momento da votação do tratado no Congresso Nacional.
Assim, tendo em vista que já tinha ocorrido o Decreto Legislativo antes do ingresso no Brasil a uma intervenção federal, o aludido tratado, ainda que o Decreto do Poder Executivo tenha ocorrido durante o aludido estado de crise, deve vigorar normalmente, não havendo que se falar em inconstitucionalidade no caso em tela.
Tal exemplo foi justamente o que aconteceu com o Tratado de Marrakesh. Na situação, através do Decreto Legislativo 261/15, o tratado foi aprovado com status de emenda constitucional.
Somente em 2018, através do Decreto Executivo 9.522/18, foi incorporado ao direito interno. O Brasil estava em intervenção federal no Rio de Janeiro, mas isso não foi óbice para a sua incorporação.
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