Disserte sobre a atipicidade de medidas executivas no âmbito da execução fiscal.
Resposta
A atipicidade dos meios executivos
É pelos meios executivos que o juiz tenta, no caso concreto, a satisfação do direito do exequente – objetivo precípuo do processo de execução –, sendo mais comum a utilização de meios sub-rogatórios e coercitivos.
Com efeito, através dos meios sub-rogatórios, o Estado vence a resistência do executado substituindo sua vontade, com a consequente satisfação do direito do exequente.
Mesmo que o executado não concorde com tal satisfação, o juiz terá à sua disposição determinados atos materiais que, ao substituir a vontade do executado, geram a satisfação do direito.
Já através dos meios coercitivos, o Estado-juiz não substitui a vontade do executado.
Pelo contrário: atua de forma a convencê-lo a cumprir sua obrigação, com o que será satisfeito o direito do exequente.
O juiz atua, neste caso, de forma a pressionar ou induzir psicologicamente o executado para que ele modifique sua vontade originária de ver frustrada a satisfação do direito do exequente.
Sempre que a pressão/indução psicológica funciona, é o próprio executado o responsável pela satisfação do direito – a satisfação será voluntária, decorrente da vontade da parte, mas não será espontânea.
São variados os meios executivos previstos em lei, do que são exemplos a penhora, a expropriação, a busca e apreensão, as astreintes, o arresto, dentre outros.
No entanto, apesar de bastante amplo o rol legal, a doutrina hoje segue o entendimento de se tratar de rol meramente exemplificativo, podendo o juiz adotar outros meios executivos que não estejam expressamente consagrados em lei.
Antes da entrada em vigor do novo diploma processual, o Superior Tribunal de Justiça já vinha reconhecendo a possibilidade de o juiz valer-se de medidas executivas atípicas, a partir do disposto no art. 461, § 5º, do Código de Processo Civil de 1973.
No Código de Processo Civil de 2015, a consagração legal do princípio da atipicidade dos meios executivos encontra-se no art. 536, § 1º.
Deveras, ao elencar as medidas executivas à disposição do juiz, o dispositivo utiliza o termo “entre outros”, demonstrando a ideia de que o rol de medidas típicas ali constante é meramente exemplificativo:
“Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente.
1º Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial.”
Nada obstante, o Código de Processo Civil de 2015 trouxe um novo dispositivo que não deixa mais margem para dúvidas quanto ao cabimento de medidas executivas atípicas na execução de pagar quantia.
Trata-se do art. 139, IV, que estabelece ser um dos poderes do juiz a determinação de todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou subrogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária.
É com base no art. 139, IV, do Código de Processo Civil de 2015, portanto, que diversas medidas atípicas vêm sendo aplicadas por juízes, inclusive em execuções que envolvam obrigação de pagar quantia.
Estabelecida a possibilidade de concessão de medidas atípicas pelo magistrado, pontua-se então os parâmetros que foram estabelecidos pela doutrina e pela jurisprudência para a sua aplicação, de forma a direcionar a amplitude do poder outorgado ao juiz nos termos do art. 139, IV, do Código de Processo Civil.
Neste ponto, segundo o STF, três são os parâmetros que devem ser observados:
- Excepcionalidade das medidas em razão da ineficácia dos meios executivos típicos, tornando-as subsidiárias;
- Proporcionalidade e razoabilidade da medida;
- Necessidade de respeito aos princípios do contraditório, ainda que diferido para momento posterior, e da fundamentação.
- Medidas atípicas e execução fiscal.
Delineado o contexto da atipicidade das medidas executivas, o cerne da questão era a aplicação destas no âmbito da execução fiscal.
Segundo o entendimento do STJ, na execução fiscal, a Fazenda Pública já gozaria de inúmeras prerrogativas previstas em lei, não sendo crível a aplicação de medidas executivas atípicas, como por exemplo, a apreensão de passaporte.
Neste sentido é a jurisprudência da Corte da Cidadania:
“RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CHEQUES. VIOLAÇÃO DE DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. DESCABIMENTO. MEDIDAS EXECUTIVAS ATÍPICAS. ART. 139, IV, DO CPC/15. CABIMENTO. DELINEAMENTO DE DIRETRIZES A SEREM OBSERVADAS PARA SUA APLICAÇÃO.
- Ação distribuída em 1/4/2009. Recurso especial interposto em 21/9/2018. Autos conclusos à Relatora em 7/1/2019.
- O propósito recursal é definir se a suspensão da carteira nacional de habilitação e a retenção do passaporte do devedor de obrigação de pagar quantia são medidas viáveis de serem adotadas pelo juiz condutor do processo executivo.
- A interposição de recurso especial não é cabível com base em suposta violação de dispositivo constitucional ou de qualquer ato normativo que não se enquadre no conceito de lei federal, conforme disposto no art. 105, III, “a” da CF/88.
- O Código de Processo Civil de 2015, a fim de garantir maior celeridade e efetividade ao processo, positivou regra segundo a qual incumbe ao juiz determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária (art. 139, IV).
- A interpretação sistemática do ordenamento jurídico revela, todavia, que tal previsão legal não autoriza a adoção indiscriminada de qualquer medida executiva, independentemente de balizas ou meios de controle efetivos.
- De acordo com o entendimento do STJ, as modernas regras de processo, ainda respaldadas pela busca da efetividade jurisdicional, em nenhuma circunstância poderão se distanciar dos ditames constitucionais, apenas sendo possível a implementação de comandos não discricionários ou que restrinjam direitos individuais de forma razoável. Precedente específico.
- A adoção de meios executivos atípicos é cabível desde que, verificando-se a existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável, tais medidas sejam adotadas de modo subsidiário, por meio de decisão que contenha fundamentação adequada às especificidades da hipótese concreta, com observância do contraditório substancial e do postulado da proporcionalidade.
- Situação concreta em que o Tribunal a quo indeferiu o pedido do recorrente de adoção de medidas executivas atípicas sob o fundamento de que não há sinais de que o devedor esteja ocultando patrimônio, mas sim de que não possui, de fato, bens aptos a serem expropriados.
- Como essa circunstância se coaduna com o entendimento propugnado neste julgamento, é de rigor – à vista da impossibilidade de esta Corte revolver o conteúdo fático-probatório dos autos – a manutenção do aresto combatido.
RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (REsp 1788950/MT, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/04/2019, DJe 26/04/2019) PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. MEDIDAS COERCITIVAS ATÍPICAS. SUSPENSÃO DA CNH, APREENSÃO DO PASSAPORTE E CANCELAMENTO DOS CARTÕES DE CRÉDITO. FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL E NECESSIDADE DE REEXAME DA PROVA.
- A fundamentação de natureza constitucional do acórdão não pode ser deslindada nesta via e a pretensão que visa convencer de que as medidas constritivas requeridas serão úteis ao fim colimado na execução esbarra no óbice da necessidade de reexame do conjunto-probatório dos autos.
- Não fosse o bastante, em se tratando especificamente de execução fiscal, esta Corte de Justiça já teve oportunidade se de posicionar no sentido de que “as medidas atípicas aflitivas pessoais não se firmam placidamente no executivo fiscal. A aplicação delas, nesse contexto, resulta em excessos” (HC 453.870/PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 15/8/2019). 3. Recurso Especial não conhecido.
(STJ; REsp 1.802.611; Proc. 2019/0067879-5; RO; Segunda Turma; Rel. Min. Og Fernandes; Julg. 08/10/2019; DJE 10/10/2019)
Detonando na Discursiva 18 de outubro
Disserte sobre a atipicidade de medidas executivas no âmbito da execução fiscal.
Resposta
A atipicidade dos meios executivos
É pelos meios executivos que o juiz tenta, no caso concreto, a satisfação do direito do exequente – objetivo precípuo do processo de execução –, sendo mais comum a utilização de meios sub-rogatórios e coercitivos.
Com efeito, através dos meios sub-rogatórios, o Estado vence a resistência do executado substituindo sua vontade, com a consequente satisfação do direito do exequente.
Mesmo que o executado não concorde com tal satisfação, o juiz terá à sua disposição determinados atos materiais que, ao substituir a vontade do executado, geram a satisfação do direito.
Já através dos meios coercitivos, o Estado-juiz não substitui a vontade do executado.
Pelo contrário: atua de forma a convencê-lo a cumprir sua obrigação, com o que será satisfeito o direito do exequente.
O juiz atua, neste caso, de forma a pressionar ou induzir psicologicamente o executado para que ele modifique sua vontade originária de ver frustrada a satisfação do direito do exequente.
Sempre que a pressão/indução psicológica funciona, é o próprio executado o responsável pela satisfação do direito – a satisfação será voluntária, decorrente da vontade da parte, mas não será espontânea.
São variados os meios executivos previstos em lei, do que são exemplos a penhora, a expropriação, a busca e apreensão, as astreintes, o arresto, dentre outros.
No entanto, apesar de bastante amplo o rol legal, a doutrina hoje segue o entendimento de se tratar de rol meramente exemplificativo, podendo o juiz adotar outros meios executivos que não estejam expressamente consagrados em lei.
Antes da entrada em vigor do novo diploma processual, o Superior Tribunal de Justiça já vinha reconhecendo a possibilidade de o juiz valer-se de medidas executivas atípicas, a partir do disposto no art. 461, § 5º, do Código de Processo Civil de 1973.
No Código de Processo Civil de 2015, a consagração legal do princípio da atipicidade dos meios executivos encontra-se no art. 536, § 1º.
Deveras, ao elencar as medidas executivas à disposição do juiz, o dispositivo utiliza o termo “entre outros”, demonstrando a ideia de que o rol de medidas típicas ali constante é meramente exemplificativo:
Nada obstante, o Código de Processo Civil de 2015 trouxe um novo dispositivo que não deixa mais margem para dúvidas quanto ao cabimento de medidas executivas atípicas na execução de pagar quantia.
Trata-se do art. 139, IV, que estabelece ser um dos poderes do juiz a determinação de todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou subrogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária.
É com base no art. 139, IV, do Código de Processo Civil de 2015, portanto, que diversas medidas atípicas vêm sendo aplicadas por juízes, inclusive em execuções que envolvam obrigação de pagar quantia.
Estabelecida a possibilidade de concessão de medidas atípicas pelo magistrado, pontua-se então os parâmetros que foram estabelecidos pela doutrina e pela jurisprudência para a sua aplicação, de forma a direcionar a amplitude do poder outorgado ao juiz nos termos do art. 139, IV, do Código de Processo Civil.
Neste ponto, segundo o STF, três são os parâmetros que devem ser observados:
Delineado o contexto da atipicidade das medidas executivas, o cerne da questão era a aplicação destas no âmbito da execução fiscal.
Segundo o entendimento do STJ, na execução fiscal, a Fazenda Pública já gozaria de inúmeras prerrogativas previstas em lei, não sendo crível a aplicação de medidas executivas atípicas, como por exemplo, a apreensão de passaporte.
Neste sentido é a jurisprudência da Corte da Cidadania:
“RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CHEQUES. VIOLAÇÃO DE DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. DESCABIMENTO. MEDIDAS EXECUTIVAS ATÍPICAS. ART. 139, IV, DO CPC/15. CABIMENTO. DELINEAMENTO DE DIRETRIZES A SEREM OBSERVADAS PARA SUA APLICAÇÃO.
RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (REsp 1788950/MT, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/04/2019, DJe 26/04/2019) PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. MEDIDAS COERCITIVAS ATÍPICAS. SUSPENSÃO DA CNH, APREENSÃO DO PASSAPORTE E CANCELAMENTO DOS CARTÕES DE CRÉDITO. FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL E NECESSIDADE DE REEXAME DA PROVA.
(STJ; REsp 1.802.611; Proc. 2019/0067879-5; RO; Segunda Turma; Rel. Min. Og Fernandes; Julg. 08/10/2019; DJE 10/10/2019)
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